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Os desafios da universalização do saneamento

O saneamento será protagonista tanto na recuperação econômica pós-pandemia, quanto na ampliação de condições sanitárias que hoje estão muito longe das ideais. Os benefícios são incalculáveis.

Setor fundamental para a saúde e a retomada da economia, o saneamento vive a expectativa de uma grande expansão nos próximos anos. Nada mais prioritário em um país onde pelo menos 48% da população, o equivalente a 101 milhões de pessoas, não têm qualquer tipo de atendimento de esgoto (coleta, tratamento e afastamento). Almejamos alcançar a universalização desses serviços – e também do atendimento de água potável, no qual ainda há um déficit de 34 milhões de brasileiros sem água de qualidade nas torneiras – até 2033. Sem a parceria e os investimentos da iniciativa privada, será muito difícil atingir essa meta.

O novo marco legal do saneamento, a Lei 14.026/20, criou um ambiente de maior segurança jurídica, competitividade e sustentabilidade para atrair investimentos privados. Esses investimentos impactam diretamente na saúde e no bem-estar das pessoas.

Uma mostra do potencial que se descortina com o novo marco legal foi dada pelos leilões já realizados após a publicação da lei (ainda que essas licitações tenham sido modeladas antes mesmo do marco entrar em vigor).

Os leilões já realizados e os já programados – como os do Bloco 3 da Cedae e de mais dois blocos de municípios em Alagoas, que ocorrem ainda este ano – demonstram que existe um caminho estruturado para avançar com os investimentos no setor, a partir das diretrizes estabelecidas pelo novo marco legal.

No Amapá, onde acaba de ser realizado com sucesso um leilão de saneamento modelado pelo BNDES e com a adesão de todos os municípios do estado, apenas um a cada três habitantes no estado conta com o acesso à água encanada, e a coleta de esgoto é restrita a 7,1% de uma população total de 750 mil habitantes. No total, 16 municípios serão beneficiados. Sem a formação de blocos de municípios preconizada pelo processo de regionalização definido no novo marco legal, não teríamos o ganho de escala que permite atender a todos, independente do tamanho do município.

Esse processo de formação de blocos de municípios para futuras concessões está avançando. Até meados de setembro, 15 Unidades Federativas já haviam aprovado a legislação que institucionaliza a prestação regionalizada (Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Paraná, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, Sergipe e São Paulo), somando 78 blocos de municípios. Outros cinco estados – Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais e Rio Grande do Sul – já enviaram para suas respectivas Assembleias Legislativas os projetos de leis que dispõem sobre a criação dos blocos. Os estados entenderam a lógica do novo momento do saneamento e estão organizando suas regiões. Cada uma dessas terá sua governança e sua dinâmica na prestação dos serviços, demandando uma sólida e comprometida articulação interfederativa

O momento é de fortalecer a Lei, cumprindo uma agenda que inclui a edição das normas de referência por parte da ANA, e dissipando todas as dúvidas que possam surgir no Judiciário. É hora de somar esforços para levar saneamento a todos. Para isso, precisamos ter o saneamento como prioridade nacional. O saneamento será protagonista tanto na recuperação econômica pós-pandemia, quanto na ampliação de condições sanitárias que hoje estão muito longe das ideais. Os benefícios são incalculáveis.

Somente na ampliação dos atuais sistemas de água e esgoto, a ABCON SINDCON estima que serão necessários R$ 500 bilhões. Para recuperar os sistemas atuais, são mais R$ 253 bilhões nos próximos 12 anos, de acordo com estudo da Associação e da KPMG.

O setor de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto tem um efeito multiplicador na economia de 2,8. Ou seja, cada real investido no saneamento gera outros R$ 2,80, cria empregos e movimenta a economia local, além de atrair investimentos de empresas que busquem localidades com boas condições de saneamento para investir, e dos ganhos com a preservação ambiental e incentivo ao turismo.

Esse valor não considera as economias na saúde, que ultrapassariam os R$ 5,9 bilhões com a universalização dos serviços, uma vez que são registradas em média mais de 350 mil internações hospitalares ao ano por doenças relacionadas ao saneamento inadequado.

Estamos falando de vidas salvas e transformadas. Saneamento é tudo isso e muito mais. É crescimento econômico, com mais saúde para a população.

Artigo de autoria de Percy Soares Neto, diretor-executivo da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (ABCON).