Em busca de soluções energéticas que contribuam para a descarbonização da economia, o mundo aposta na produção do hidrogênio verde (H2V), considerado a energia do futuro. Entre as diversas metodologias de produção desse combustível, a mais discutida e difundida é a eletrólise da água, que consiste na passagem de corrente elétrica em uma solução de salmoura.
Diante dessa perspectiva, as indústrias do setor de cloro-álcalis assumem um papel estratégico, uma vez que utilizam esse processo para a produção de cloro e seus derivados. Atualmente, o setor tem capacidade para produzir cerca de 40 mil toneladas de hidrogênio verde por ano (a estimativa considera um rendimento de 90% do processo), e a expectativa é de que a capacidade de produção aumente para 70 mil toneladas/ano até 2032.
Vale ressaltar que, para que o hidrogênio seja classificado como verde, é necessário que seja produzido a partir de fontes de energia limpas e renováveis. Este é o caso da maior parte das plantas de cloro-álcalis das indústrias brasileiras. No Brasil, 83% da matriz elétrica é renovável e muitas empresas vão além, tendo investido em grandes projetos de autoprodução com fontes eólicas e solares ou adquirindo energia de fontes renováveis disponíveis no mercado.
Para falar sobre os cenários, perspectivas e desafios para a produção de hidrogênio verde, Helton José Alves, diretor Técnico e Científico da Associação Brasileira de Hidrogênio (ABH2) e professor da Universidade Federal do Paraná, esteve presente no XII Seminário Técnico Internacional e Table Top Expo & Safety Workshop 2022, maior evento do setor de cloro-álcalis da América Latina realizado pela Clorosur na Costa do Sauípe. Confira o bate-papo realizado com o palestrante.
– O que é hidrogênio verde? Ele pode, realmente, ser considerado a fonte energética do futuro?
R.: O termo “hidrogênio verde” é utilizado para definir a molécula de hidrogênio produzida a partir de fontes renováveis de energia, com emissão de carbono nula. Porém, existe uma tendência em classificar o hidrogênio de uma forma mais abrangente, de acordo com os níveis de emissão de carbono envolvidos em sua produção global. Neste sentido, considerando a diversidade de matérias primas e de rotas tecnológicas disponíveis para garantir sua produção, a elevada eficiência na conversão energética envolvida nos processos que o utilizam, e o papel estratégico que pode desempenhar na transição energética com vistas à descarbonização da indústria, podemos afirmar que o hidrogênio é o ativo de maior aposta no futuro próximo.
– Qual é a rota de produção de hidrogênio verde viável comercialmente no mundo e no Brasil?
R.: A rota mais discutida e difundida para a produção do hidrogênio verde é a eletrólise da água. Neste processo deve-se utilizar energia elétrica renovável para promover a quebra da molécula de água, com consequente separação do hidrogênio. Quanto à viabilidade desta rota, deve-se levar em conta o preço da energia elétrica local, bem como o caráter renovável da mesma, dentre outros fatores. Vale destacar que outras rotas também podem levar à obtenção do hidrogênio de baixo carbono, carbono neutro ou até negativo, como é o caso da rota da biomassa com captura, armazenamento e/ou uso do CO2 (CCS, CCU ou CCUS) associado.
– Quais são os principais desafios para que a indústria de cloro-álcalis tenha condições de produzir comercialmente hidrogênio verde? O hidrogênio seria competitivo no mercado para deixar de ser fonte térmica como é hoje?
R.: O maior desafio inicial é demonstrar o nível de emissões de carbono envolvido no processo de produção do hidrogênio. Além disso, há questões como as adaptações da infraestrutura envolvida para a purificação, o armazenamento e o transporte do hidrogênio, que devem ser implementadas para atender aos níveis de exigência comerciais. Acredita-se que o hidrogênio produzido pela indústria cloro-álcalis possa, sim, ser competitivo, considerando seu baixo custo de produção e o fato de ser produzido por uma rota similar ao hidrogênio verde. Entretanto, os preços do gás natural para as indústrias cloro-álcalis e do hidrogênio no mercado devem regular a competitividade do hidrogênio neste setor.
– Quais são as utilizações mais promissoras do hidrogênio no futuro próximo?
R.: Pelo fato do hidrogênio ser um vetor energético, ele possui diversas aplicações com potencial para descarbonizar a economia mundial. Um dos principais setores em que o hidrogênio deve ser utilizado é o de transportes – tanto seu uso direto, em veículos elétricos equipados com células a combustível, quanto sua utilização em processos químicos para a produção de combustíveis sintéticos (ex.: bioquerosene de aviação), são apostas promissoras. Outra área de grande demanda mundial é a de fertilizantes. Utiliza-se amônia para a produção de fertilizantes nitrogenados, que por sua vez é gerada a partir do hidrogênio e do nitrogênio. Como praticamente todo o hidrogênio utilizado atualmente para a produção de amônia provém da reforma do gás natural, o hidrogênio renovável de baixo carbono e/ou o hidrogênio verde, pode(m) contribuir para tornar a amônia verde uma molécula estratégica para a descarbonização da agricultura mundial, além de ser uma opção interessante para o transporte do hidrogênio em longas distâncias, uma vez que cada molécula de amônia possui três átomos de hidrogênio.